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17 de dez. de 2007

A morte do lutador Ryan Gracie

A morte do lutador Ryan Gracie movimentou São Paulo e Rio de Janeiro. O que se sabe até agora: drogado, ele roubou um carro, tentou roubar outro carro, agrediu um motoqueiro, foi preso e morreu na cadeia. O que ainda não se sabe: morreu de quê? Por que ficou na cela e não foi levado para um hospital? A família dele se mostra inconformada e acusa o médico que o atendeu na delegacia. A família Gracie, acostumada a vitórias, sentiu a dor da perda. “Ele era um guerreiro da família, um soldado da gente, todo mundo gosta dele”, apontou o irmão de Ryan, Ralph Gracie. No enterro, no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro, os amigos, os alunos e os parentes se despediram de Ryan Gracie com aplausos. “Vai ser muito difícil porque meu irmão era meu herói, minha vida, era tudo, era a coisa mais importante para mim”, disse o irmão de Ryan, Robson Gracie Filho. Ryan era pai de verdade. Deixou um filho, de 6 anos. Começou a lutar aos 12 anos, seguindo a tradição da família. E se tornou pentacampeão de um dos mais importantes torneios mundiais de vale tudo. Ryan gostava de brigar, não só dentro dos ringues. Em 2000, ficou preso por 15 dias acusado de esfaquear um estudante durante uma briga em uma boate no Rio de Janeiro. Em 2005, agrediu policiais em uma delegacia em São Paulo. O comportamento de Ryan ia contra a filosofia da família. Ele chegou a ser repreendido pelo patriarca dos Gracie. “Ele deve cumprir com a Justiça e com o castigo que for estabelecido, seja ele quem for, até meu pai”, disse Hélio Gracie ao Fantástico (23/02/2000). Amigos mais próximos sabiam que a agressividade de Ryan não era só resultado de uma personalidade forte. Ele também fazia uso de drogas. “Ele falou que ia tentar mudar, mas não conseguia largar. Esse que é problema, não só dele, mas de toda a juventude que bebe, fuma, usa drogas”, o bicampeão mundial de jiu-jitsu Amaury Bitetti A família quer uma resposta. Por que, apesar dos sinais de que não estava bem, Ryan foi mantido na delegacia? Por que não foi levado ao hospital? Uma briga que o clã do jiu-jitsu quer levar para a Justiça. “Pretendemos processar o psicanalista”, apontou o pai de Ryan, Robson Gracie. Acusações contra o médico A irmã de Ryan Gracie, Flávia, fez graves acusações contra o médico que atendeu o lutador em uma delegacia de São Paulo. Ela acusa o médico de ter errado na dose da medicação e disse que ele pediu dinheiro para subornar policiais. A causa da morte de Ryan Gracie só deve ser conhecida em 30 dias, quando sair o laudo do Instituto Médico Legal. As investigações estão a cargo da Polícia Civil de São Paulo. A secretaria de segurança pública diz que só vai se pronunciar depois que sair o laudo do Instituto Médico Legal (IML) sobre a causa da morte de Ryan Gracie. No Rio de Janeiro, depois do enterro, a irmã do lutador, Flávia Gracie, disse que pagou R$ 5 mil para que o médico Sabino Ferreira acompanhasse Ryan na prisão. Fez uma denúncia grave: ele teria pedido que ela pagasse R$ 2,5 mil para que o irmão fosse bem tratado na delegacia. “Ele foi às 5h receber o dinheiro para receber o dinheiro que havia cobrado e falou que eu precisava mandar dinheiro para o carcereiro senão a coisa não funcionava, que eu tinha que dar, no mínimo, R$ 2 mil, R$ 2,5 mil para o delegado, que eu tinha que pagar todo mundo em São Paulo, senão eles não olhariam por nada, não poderíamos dar assistência a ele”, conta Flávia Gracie. Antes mesmo de saber das denúncias, o médico Sabino Ferreira Neto disse que cobrou R$ 5 mil da família Gracie para atender Ryan. “Estabeleci com ela o valor, para ida a São Paulo, de R$ 5 mil”, admite o médico. Não mencionou ter pedido R$ 2,5 mil para os policiais. Mas uma quantia menor para comprar comida para Ryan. "Ainda pedi para a irmã R$ 100 para dar para o carcereiro comprar pizza porque ele não tinha se alimentado”, afirma o médico Sabino Ferreira Neto. A corregedoria da Polícia Civil disse que só vai apurar a denúncia de suborno se a família Gracie formalizá-la. Ryan foi preso na sexta-feira à tarde. Ryan Gracie saiu do apartamento onde morava, no bairro do Itaim Bibi, na Zona Sul de São Paulo, descalço, vestindo uma bermuda, e com uma faca na mão. De lá, começou uma trajetória de incidentes que terminaria na sua morte, quase 20 horas depois, dentro da cela de uma delegacia de São Paulo. Na rua, Ryan bateu no vidro de um carro, entrou no banco de trás e teria ameaçado o motorista com uma faca no pescoço. O motorista conseguiu fugir e o lutador assumiu o volante. Ele abandonou o carro, depois de bater em um banco de concreto. Em seguida, ameaçou roubar outro carro, mas o motorista escapou. Ryan tentou então roubar uma moto. O motoqueiro reagiu e o lutador logo foi cercado por um grupo de 30 motoboys. Foi agredido e dominado até ser preso pela polícia. “Ele estava agressivo e não falava palavra com palavra”, conta um policial. “Ele declarou que achava que estava sendo perseguido e entrou dentro do carro da pessoa para tentar fugir”, diz o advogado Rodrigo Souto. Por volta das 15h, Ryan foi levado para a delegacia. À noite, a noiva dele chamou o médico, que fez um teste e constatou: o rapaz tinha usado cocaína, crack e maconha. À 0h30, Ryan foi levado para o IML para fazer exame de corpo de delito. Foi caminhando. Às 3h, seguiu para outra delegacia. Lá, o médico aplicou um coquetel de seis remédios para acalmar o lutador e só deixou a delegacia às 6h. Ryan ficou sozinho na cela. “Se tivesse que repetir a medicação, eu repetiria porque, inclusive, eu considero uma dosagem pequena. O meu intuito não era cedá-lo por muitos dias, já que ele estava sem comer. Só queria deixá-lo sem grande ação”, diz o médico Sabino Ferreira Neto. Às 8h, Ryan foi encontrado morto. “Há três presos na cela ao lado onde ele se encontrava, e perguntei para eles se havia pedido socorro na madrugada, ou se havia indícios de que estava passando por dificuldades. Os presos disseram que ele respirava com dificuldade, mas não pediu socorro a ninguém”, aponta o delegado Paulo Bitencourt. Especialistas consultados disseram que não é possível avaliar se a medicação dada dentro da cadeia causou a morte de Ryan. Mas que o correto era ter feito o tratamento dentro de um hospital. “O correto seria encaminhá-lo a um hospital para ser avaliado, para ver se ele não está com super dosagem. No hospital ele teria mais condições de tratamento”, avalia o psiquiatra Paulo César Sampaio. “É necessário um ambiente hospitalar, protegido e específico para um paciente em agitação”, diz o psiquiatra do Hospital das Clínicas (SP) Táki Cordas. Segundo a polícia, em nenhum momento o médico particular de Ryan, Sabino Ferreira, pediu que ele fosse levado para um hospital. No IML, onde também há médicos, ninguém sugeriu que ele fosse encaminhado a um atendimento especializado. O IML fica em frente ao Hospital das Clínicas, que é público e atende presos.
Fonte: Jornal Bom Dia Brasil Rede Globo

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